terça-feira, janeiro 30, 2007

Comédia! Comédia! Comédia!

(Juvenal Garcês - Fundador, Director e Encenador da Companhia Teatral do Chiado - Teatro Estúdio Mário Viegas)


Dez anos a fazer rir! 1.021 representações! 155.237 espectadores e 118 digressões!
Quando, em 1996, decidi dirigir este espectáculo tinha desaparecido um dos maiores actores portugueses e uma das personalidades mais marcantes do teatro português do pós 25 de Abril – Mário Viegas! Um mestre na arte da comédia.
O Mário Viegas foi, não tenhamos medo das palavras, um “Grande Cómico” e não só…! Era justo mostrar o que tinha aprendido com ele e dar-lhe continuidade! Por isso resolvi dirigir este espectáculo: As Obras Completas de William Shakespeare em 97 Minutos.
A comédia sempre foi o género de teatro mais amado pelo grande público.
A comédia é o retrato mais fiel da sensibilidade popular!

Muitas vezes sou abordado na rua e perguntam-me:
- o que é que estão a fazer agora?
- Estamos a ensaiar um novo espectáculo!
- E é para rir?

O povo (esta palavra tão fora de moda) sempre gostou de censurar os erros e os vícios do seu tempo com críticas mordazes, jocosas. Por isso, o Mário Viegas, seguindo esta grande tradição teatral, fundou a CTC e escolheu para padroeiros desta companhia o Bucha e o Estica, os dois cómicos mais populares de sempre.
E como rir é o melhor remédio Shakespeare escreveu 16 comédias. E nada melhor que o riso para provocar o escárnio, a simpatia, a alegria, o júbilo e a cumplicidade do público…! Mesmo nas suas grandes tragédias, dez, Shakespeare não resistiu a colocar cenas ou personagens de comédia nos primeiros planos para provocar o riso… era preciso rir com um olho para depois chorar com o outro! Uma vez, assistindo a uma representação da famosa tragédia Ricardo III, o público, com a morte do rei, não se coibiu de rir e bater palmas. Era uma maneira de castigar o famoso vilão de Shakespeare!
Muitos “bem pensantes” em Portugal tentaram fazer-nos crer que a comédia é um género menor, que é “ir atrás do público”… chegando mesmo a afirmar que ter público não é importante. Para eles vai a minha grande gargalhada!
Muitos dirão que estou a falar de “lugares-comuns”, mas o que não é comum é que hoje, em plena época natalícia, por excelência festiva, a cidade de Lisboa, que se diz europeia, tenha apenas 3 comédias em cartaz (duas delas aqui no Teatro Mário Viegas). Meus senhores, isto não é normal!
Com esta paródia ao génio de Shakespeare a CTC pôde levar à cena dramaturgos como Henrik Ibsen, August Strindberg, Samuel Beckett, John Osborne, Israel Horowitz, Peter Shaffer, Bill Manhoff, John Godber, Charles Busch, José Jorge Letria e Almada Negreiros.
As Obras Completas de William Sakespeare em 97 Minutos têm sido o retrato fiel do meu país: Muito riso e pouco dinheiro! Dez anos a rir muito para não chorar.
Nos últimos anos o Teatro Mário Viegas, em pleno coração da cidade, tem tido o apoio do MC de 80 euros por dia enquanto outros espaços teatrais chegam a ter 1700 euros diários! Muitos dirão que a arte não é justa mas cruel! A esses respondo-lhes com a mesma crueldade: os pobres não têm tempo para meter lá os pés! Ou, se quiserem: os pobres não entram na casa dos ricos! Melhor ainda: não fazem parte do grande Teatro, o Teatro que é eleito por aqueles que estão mais próximos do céu! Alguns pensarão que estou a ser demagogo e vaidoso, não! Só quero um país mais justo!


[Discurso de Juvenal Garcês, director artístico da Companhia Teatral do Chiado e encenador do espectáculo As Obras Completas de William Shakeaperea em 97 minutos leu no dia do 10º aniversário desde estectáculo - 28 de Novembro de 2006]

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